Coragem, Convicção e Esperança

Por Daisaku Ikeda

Todos, suponho, têm recordações  da mocidade. Com efeito, de outra forma, dificilmente se poderá  dizer Ter vivido ao menos seus anos de jovem. Eu, como todos os mais, tive meu quinhão.

Minha família era pobre, e meus quatro  irmãos mais velhos foram todos convocados pelo Exército e mandados para  a frente de batalha. Em conseqüência, eu não dispunha de  dinheiro nem de tempo para freqüentar a escola da maneira normal. Em vez disso, trabalhava durante o dia e, com o dinheiro que conseguia,   freqüentei a escola comercial, e mais tarde o colégio à noite.

Minha saúde não era muito boa. Apesar  disso, tentei dar conta do recado o melhor possível. Houve  ocasiões em que, cuidando de pequenos encargos para a companhia onde trabalhava,  tinha de caminhar lentamente ao longo de Ginza puxando uma carreta grande. Outras  vezes, lembro-me de Ter apenas uma camisa de gola aberta para usar, mesmo  quando os ventos de outono começavam a soprar. Mas não sentia  vergonha ou constrangimento algum. Pelo contrário, via-me como personagem de   um drama -um jovem, sorrindo e lutando contra as durezas da vida, e chegava a orgulhar-me. Com efeito, estou certo de que as dificuldades que tive de enfrentar na época me ajudaram a construir os alicerces de meu  atual estilo de vida.

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Daisaku Ikeda é pacifista, escritor, filósofo, fotógrafo e poeta.  Também conhecido como "Embaixador da Paz", é presidente da Soka Gakkai Internacional (SGI), uma ONG, com base budista,   filiada às Nações Unidas, que atua nas áreas da cultura, educação, paz, meio-ambiente, desarmamento nuclear e apoio a refugiados de guerra.

Na ocasião, tinha uma certa convicção...não, seria mais exato chamá-la  uma resolução. Acreditava que a juventude não era algo  para ser vivido em vão. Estava decidido que, mesmo pobre e surrado,  caminharia de cabeça erguida, aproveitando qualquer estímulo que pudesse  achar e viveria a vida o mais plenamente possível. Essa determinação, que serviu como apoio na época,  mantenho imutável hoje em dia. Pondo de lado todas as  considerações acerca de posição, riqueza e reputação, a vitória final reside em saber que se está fazendo o melhor   possível como ser humano, e essa é a maior vitória  de todas. Trata-se de algo que não pretendo esquecer até o término de mus dias.

Quando olho em retrospecto para os dias de minha  mocidade, há coisas que me fazem parar para refletir. Para começar,  gostaria que em minha adolescência e juventude tivesse estudado mais, particularmente as matérias fundamentais. Certamente eu percebia  como era importante a mocidade, e achava que estava lendo inúmeros livros.  Mas agora me arrependo de não Ter lido dez ou vinte vezes mais.  Também gostaria de ter-me exercitado mais e enrijecido meu corpo.

Com a ajuda de uma compreensão tardia, percebo  agora quão extremamente importante é o período da adolescência. Quem sabe não seria exagero dizer que todo o  restante da vida da pessoa é determinado pela maneira como passa os anos   da mocidade.

Os jovens se acham em pleno processo de  formação, mas por isso mesmo se acham não-acabados. São quantidades desconhecidas, plenas de possibilidades. Os jovens trazem consigo os  ventos da mudança e da reforma, e são possuidores de enorme e irreprimível vitalidade. Há pouca coisa capaz de igualar a  grandeza da mocidade. Mas se um jovem negligenciar na  construção e passar o tempo todo em bobagens, ou se for excessivamente cautelosa em  suas metas e permitir-se ficar fraco ou ineficiente, então é  culpado, poder-se-ia dizer, de suicídio espiritual. Nenhuma outra linha de  ação poderia ser mais superficial e inadequada.

Temos de perceber que todo jovem que vive é  até certo ponto animado pelas paixões juvenis que lhe circulam pelas  veias. Se apenas direção e finalidade firmes puderem ser dadas a  essas paixões, então sem dúvida os jovens poderão  aprender a contribuir para o bem-estar da sociedade e a viver vidas realmente significativas. Muitos líderes de hoje, contudo, embora prontos  para criticar os moços, parecem dispensar escasso tempo para pensar em  seus próprios malogros e deficiências. Só pensam em sua própria fama e proveito, trabalham apenas por sua própria glória e progresso, e não entendem absolutamente os corações e mentes dos jovens.

Isto pode parecer uma afirmativa bastante  impertinente para se fazer. Mas gostaria de mencionar que, em um trabalho escrito há  dez anos, tive ensejo de observar o seguinte: "Não pode haver  dúvida quanto ao surto e queda da nação e a prosperidade e declínio da época serem em grande parte determinados pelo   grau de consciência própria de parte da juventude e da direção que ela segue. (...)

Há, contudo, um fato que nunca deve ser  esquecido: o de que sejam quais forem os esforços construtivos em que possamos  nos empenhar, eles devem ser invariavelmente buscados sob a  inspiração e orientação dos mais elevados ideais e dos mais capazes líderes. Sem tais ideais e sem líderes assim, a  paixão e a vitalidade da mocidade, independente da idade que se esteja vivendo, serão despendidas em atividade inútil. E se os jovens  forem induzidos a seguir falsos líderes e ideologias, então partirão para motins e destruição com a  violência de uma impetuosa torrente."

É direito de cada indivíduo buscar  sejam quais forem os ideais, filosofia e líderes que desejar. Fico  entristecido apenas pelo fato de que os homens hoje investidos em poder  político sejam incapazes de oferecer o quer que seja aos jovens. Parece-me que eles  precisam dedicar mais atenção e meditação sobre o  rumo a que estão levando o povo deste país. Não acredito que a   tendência dos acontecimentos mundiais permitirá ao  Japão prosseguir indefinidamente em seu presente estado de espírito de prosperidade pacífica porém irresponsável.

Baseado em minha própria experiência,  diria que as qualidades mais indispensáveis à juventude são  coragem, convicção e esperança. Ação corajosa   por parte dos moços é a fonte de que tudo mais é  criado. E é a convicção que orienta e apóia a coragem.  Encarando a sociedade de hoje, quantas inúmeras pessoas vemos  desprovidas de convicção! Uma vida dedicada exclusivamente a bajular  outros e a concordar com as opiniões deles é tão oca e sem  valor quanto espuma na crista de uma onda. A convicção  não conhece hesitação nem confusão de metas. E este gênero de convicção é algo que brota  naturalmente dos esforços concretos de uma pessoa para cumprir suas  responsabilidades e missão na vida. Finalmente, uma vida sem esperança, um  jovem que sente não ter futuro, é pouco mais do que um  cadáver vivente. Os maiores homens são aqueles cujos anos juvenis  estão cheios de sonhos e ideais, e que continuam no decurso de suas vidas a   perseguir tais sonhos e ideais.

Os jovens são o tesouro de uma  nação, a riqueza da era do porvir. Não há poder comparável  ao valor desse tesouro. Fazer qualquer coisa capaz de ameaçar o futuro  desses jovens, ou privá-los do seu vigor, equivale a lançar   nossos próprios tesouros ao mar. E os líderes que vão  realmente um passo adiante e mandam os jovens para o campo de batalha, onde preciosas  vidas são perdidas para sempre, por certo merecem ser chamados de os  homens mais perversos do mundo.

Tenho grande afeição pelos jovens, e  minha maior alegria é observá-los crescendo. A visão deles  amadurecendo em um ambiente de saber, paz e felicidade faz meu coração  dar pulos de alegria. É minha esperança atual poder passar o  resto da vida caminhando lado a lado com os jovens e respirar o ar que respiram.  E se puder, afinal, vê-los ascender à plataforma que  construirmos juntos e pairar no ar, um por um, pela causa da paz e do progresso cultural do   mundo, conhecerei a satisfação de minhas esperanças, a consecução de minha maior alegria.


IKEDA, Daisaku, "Crianças de Vidro e Outros Ensaios" (páginas 50, 51, 52 e 53) Editora Record

Preciosa Colaboração de Wellington Sversut de Bauru-SP.
e-mail:
wrs@blv.com.br
 

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