Pensamentos sobre a Paz

Por Daisaku Ikeda

Algumas pessoas que vêem cenas de guerra no cinema ou televisão podem ficar impressionadas, e certa forma, chegam a apreciam a valentia dos atores.

Entretanto, a realidade da guerra é completamente diferente. É cruel e cheia de tristeza e miséria. Ninguém que realmente tenha passado por esta experiência, deseja que se repita. Eu já presenciei mais do que o suficiente sobre os horrores da guerra quando era jovem, vivendo sobre bombardeios aéreos na qual explosivos e bombas incendiárias caiam como chuva. Mergulhado num mar de fogo, preocupado com a minha família, sentindo uma terrível tristeza e abandono quando presenciava pessoas morrendo ao meu redor.

Não importa que tipo de justificativa possa ser oferecida, no meu ponto de vista, não há absolutamente algo como uma guerra justa e correta. A guerra trata a vida humana como um meio para se alcançar um fim e somente traz sofrimento e miséria para as pessoas comuns, para as mães de familia. Cada pessoa que falece na guerra é insubstituível e preciosa – quer seja o pai, o filho ou amigo de alguém. Esta é a razão para que sejamos contra a guerra. Todas as rivalidades e conflitos devem ser resolvidas, não pelo poder, mas pela sabedoria e diálogo contínuo.

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Daisaku Ikeda é pacifista, escritor, filósofo, fotógrafo e poeta.  Também conhecido como "Embaixador da Paz", é presidente da Soka Gakkai Internacional (SGI), uma ONG, com base budista,   filiada às Nações Unidas, que atua nas áreas da cultura, educação, paz, meio-ambiente, desarmamento nuclear e apoio a refugiados de guerra.

É tentador pensar que as guerras são iniciadas pelo Estado ou por uma aliança de países. Entretanto, de fato, as guerras têm início no coração de cada ser humano. O budismo ensina que a guerra é resultado do ódio e egoísmo. Para sobrepujá-la, nós devemos conquistar e subjulgar a natureza egoísta que reside em cada ser humano.

Os desastres naturais como inudanções ou terremotos não podem ser prevenidos pela razão humana ou sabedoria. Mas, os problemas causados pelos próprios seres humanos podem ser resolvidos por nós mesmos.

Linus Pauling, ganhador de dois prêmios Nobel, escreveu no seu livro "No More War"(Guerra Nunca Mais). "Eu acredito que há um poder maior nomundo do que o maléfico poder da força militar ou das bombas nucleares – há o poder da bondade, da moralidade, do humanismo. Eu acredito no poder do espírito humano".

Eu também acredito que uma mudança interior nas profundezas da vida humana possa transformar o egoísmo e substituí-lo com um dedicado humanismo que busca a paz e a coexistência entre todos os povos.

O que detém este "poder da bondade" de possuir um impacto maior no mundo ? O que impede o progresso do movimento em prol da paz ? Em uma única palavra, é a desconfiança. É o preconceito que cresce da desconfiança. Geralmente, há raízes em conflitos ou rivalidades passadas e sem a remoção desta muralha de desconfiança e sem o esforço em descobrir a bondade que brilha em cada ser humano, nenhum progresso com relação a paz será possível.

Quando eu visitei a União Soviética pela primeira vez, no início da década de 70, as pessoas perguntaram a razão de um líder religioso querer visitar um país comunista que não reconhece a religião ? Eu respondi: "Porque os cidadãos da União Soviética são pessoas, seres humanos como eu". Eu estava buscando algum meio de criar um novo caminho - de transformar a desconfiança em confiança, o medo em segurança, um doentio olhar pelo passado em um comprometimento em prol do futuro. Em cada país que visitei, eu sempre senti o quanto as pessoas buscavam pela paz.

A primeira condição para a paz mundial é que as pessoas devem realmente aprender uma com as outras, devem começar a realmente entender e apreciar uma às outras. O caminho seguro para se derreter o "gelo" da desconfiança é promovendo a interação entre pessoas comuns – através de reuniões, visitas, e intercâmbios culturais e educacionais. Os jovens que não são conduzidos pelas experiências do passado podem promover este movimento.

Há muitos anos atrás, era tradição entre os índios no Canadá, promover uma grande celebração quando um filha alcançava a maioridade.

As duas filhas de um grande chefe haviam alcançado a maioridade e uma grande festa estava sendo preparada. Mas, surgiram notícias de que os inimigos do norte estavam se preparando para a guerra. As filhas prontamente foram conversar com o pai e disseram: "Querido pai ! Algum dia nós iremos ser mães e daremos nascimento a uma criança que irá crescer para se tornar fortes chefes como o senhor. Por favor, em prol delas, convide o povo do norte para nossa celebração".

O chefe não podia recusar o pedido de suas filhas e embora relutante,enviou uma mensagem para os inimigos de longa data, convidando-os. Eles vieram em grande número, trazendo suas esposas e filhos e muitos presentes. Os sons da guerra se transformaram em sons de alegria.

Posteriormente, ambas as irmãs deram luz a um filho e eles se tornaram dois chefes chamados Paz e Amor Fraternal. Perto da cidade de Vancouver, na costa leste do Canadá, há uma bela montanha com dois picos e de acordo com a lenda, as duas irmãs que amavam a paz tornaram-se este picos e até hoje observam a cidade. Mesmo o coração pacífico de uma única mulher é poderoso, pode mudar a sociedade e transformar a história.

É muito arriscado deixar o futuro do mundo nas mãos dos políticos. O povo deve ser sábio e tomar suas próprias decisões para se criar a paz. Devemos nos unir ultrapassando as fronteiras: uma união que rejeite terminantemente a própria guerra. Quando o povo de um determinado país se comunica com os outros povos, poderão criar uma corrente de paz. É vital o estabelecimento de uma rede de pessoas que transcendam as fronteiras nacionais para que um pequeno número de líderes corruptos não possam romper a malha de solidariedade e amizade que os une.

A paz nunca poderá ser atingida se houver uma atitude passiva de somente aguardar pelo futuro. É necessária a participação de todos - não importando o quão fraco possamos pensar que somos - para se construir um profundo alicerce pela paz em nossos corações que possa perdurar e posteriormente silenciar, os incessantes chamados pela paz.

Como a escritora chilena Gabriela Mistral escreveu: "Tenha coragem, meus amigos, pois o pacifismo não é tão doce o quanto alguns possam dizer…Continue bradando pela paz, contra os ventos e as ondas…O pacifismo não é algo fácil. Ninguém deve enfrentar a injustiça com o silêncio. Meus amigos, continuem a bradar, até que o círculo de paz seja expandido".

A paz verdadeira somente poderá ser encontrada na realidade da vida diária. Nós devemos plantar as sementes da paz fundamental nas vidas diárias de cada indivíduo, em nossos corações e em nossa vida interior. Nós devemos proteger e cuidar destas sementes até que cresçam numa firme realidade para todos.

Assim, depende de nós construir um mundo sem guerras. Nós iremos desistir deste objetivo ou iremos continuar o desafio, mesmo que haja grandes dificuldades ? Neste sentido, o destino do século XXI está em nossas mãos.

Fonte: Daily Mirror, 28 de dezembro de 1998

Preciosa Colaboração de Charles Chigusa
e-mail: chigusacharles@hotmail.com

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